terça-feira, julho 19, 2011

O fato, comendo

Desde cedo o dia abre-se cinza, as primeiras nuances são escuras, passam-se algumas horas até vir a coragem de adentrar a porta. Aquele cheiro de sempre, exalando das rugas, é muito marcante. Parece um mofo, incomoda-me o nariz, mas é preciso relevar pois este corpo me pede um respeito que parece que não sou obrigado a obedecer. Tem vezes que olhá-la, rememora-me um ritual infinito, imaginário: limpar sua casa, lavar sua louça, nunca tocar na sua comida; jamais perguntá-la os motivos de porquê ser assim.
Sento-me e noto que as paredes sugerem figuras e me entretenho por um tempo até que chama "vem, está na hora". Muito forte o apelo da crença agora, quando levanto-me para agradecer, com um gesto de corpo, para que todos notem, inclusive Ele, que todos os esforços são compensados nesses momentos em que partilhamos.
Questiono sobre aonde ficaremos: sentaremos aqui. Frente a frente. Eu no sofá, ela na mesa. Ainda mereço um tanto de conforto; ela resiste forte, segue a função, obedece a moral.
A porta colorida numa tentativa de bordô aquece, contrasta esse dia supostamente frio mas sufocante, abafado. Ruboriza toda a pele exposta, tenho vergonha de ficar nessa casa. Tudo tão perto, tão aberto e intocável ao mesmo tempo. No prato, um pouco de comida, um pouco de comida, um pouco de comida, para nós dois. Peixe, arroz, limão. A providência máxima de sentimento que invadiu-me o peito, uma única vez. Não a vejo mais. E lembro, hoje, ao acordar, do mofo perfumado que ficava exalando do corpo envelhecido.

sexta-feira, julho 01, 2011

Às vezes domina um sentimento, vontade abrupta de parar completamente todo o movimento
Que não se explica. É um espelho aonde não reflito.
Amadureço invisível aos meus olhos e desvio pro lado: não me vejo passar...
Quanto mais explico as perguntas, outras me seguem. O conflito não reside na dúvida em fazer mas é o instante decisivo que está em jogo: a hora certa para definir se o que está sendo feito é realmente o intencionado. Não é para que eu pareça um cachorro, meus olhos são humanos, não tenho nenhum outro apelo. Olho com este mesmo olho que lê, mas penso e enxergo ludibriado por uma crença infundada. Ainda não parei de escrever e parece que já perdi o fio da meada. Se o caminho é sinuoso, não há motivos para tonturas; girar é preciso e quão mais aumentar a velocidade, logo é possível voar em espiral rumo às alturas. Lá onde não residem as glórias, mas a visão do todo. Nessa geral caminha o coração que vai batendo sozinho enxergando realidades que não palpitam juntas, mas que se completam e salientam o meu saber de que o que infiltra, também jorra, e jorra igual, em todos os lugares.
O que o corpo sente
A boca não vai dizer.