segunda-feira, junho 30, 2008

O relato à nudez eólica

Na distância dos dias perdeu-se a canção de rumores sobre a tua existência ainda tênue. Sem linhas a demarcar teu mundo, a essência da vastidão não tem sentido. O caminho torna-se curto numa estrada sem fim, e sem começo.

Teu som marcante acompanha um paralelo que não se conhece; tua palavra arrebata a alma pra longe, e pra perto de qualquer fonte. És a fonte que jorra lirismos.
O berço onde criam-se entidades. Do mal e bem.

No movimento sutil de teus lábios, a grandeza de teu ser mostra-se completamente irreconhecível ao meu ego. Meu ego esconde de minha superfície quem sabemos que és. Minha mente domina, pequena, o espaço que me concedestes.

E nestes passos, o caminho não tem fim, a estrada não é passageira. Arquiva-se em amor e lembrança tudo que queres sentir. Até a dor é a tua flor sem espinhos, na beleza que emana de teus olhos.

Abrigas vários em teus braços sem a cobrança de um abraço e nos sorrisos escondem-se todos os abraços de agradecimento que deverias ganhar, mas que não pedes. O que transforma o amor em cortesia e a desgraça da companhia sem influência em companhia certa?

A morada que constróis é a pousada que me aconchega e as palavras que não dizes são os sopros retratados nus, no vento.

terça-feira, junho 03, 2008

Aquecida, a madrugada

Hoje ele é frágil, fraco, indeciso e não prende mais a respiração por medo de realmente parar. Parar de ser tudo que é de uma vez só, para aprender em outros livros as medidas de seus sentimentos relacionados ao mundo de fora. Ao mundo de longe, perto do mar.
Os seus olhos, dois frascos do veneno da alma, estão bem vazios e secos. Já despejaram veneno na janela, corroendo a madeira do parapeito e manchando as roupas novas que ganhou de um velho amigo.
Ao ouvir a rádio pela manhã, ele esquece que de novo, foi preso por si próprio numa jaula de emoções. E que são tão concretas... que nunca se quebram. Derretem com o resfriamento de seu corpo ao longo dos dias de cárcere. Aprendeu no cárcere dos sentidos que a convicção é uma jaula e que cada barra é um significado. Que cada gesto é como um beijo, que não existe.

segunda-feira, junho 02, 2008

No deserto de alguém

Num campo coberto por folhas secas, pairava o sentimento de isolamento. E ela sem saber o que sentir, entregava-se totalmente ao ambiente. Era uma flor morta. Com beleza renovada.
Do seu perfume, que já não tem mais graça, ficou só a lembrança. É o odor fétido que afeta os arredores agora! Sem a música dos pássaros e todos os outros chavões da alegria.
Seus olhos tão pequenos são os espelhos da tristeza. Um lago profundo que reflete a amargura da alma. Um pedaço de loucura jogado perto do profundo azul onde afogam-se os contempladores do desespero...
Tornou-se já tão usual caminhar sobre a sofreguidão, que os galhos que ao se quebraram, furam seus pés, já não fazem-na sentir nada. É o suave toque da percepção que faz lembrá-la de que ainda está viva. E quase morta.
Morta ao ponto de não ver horizontes. Só os mesmos campos vazios, e opacos.
É uma beleza que transmuta a alma e volta ao corpo com efeito negativo. Com efeito de existência.
Ela odeia a beleza que não mente; a realidade feriu-a demais e caminhar com o corpo coberto com cicatrizes apenas torna o contato com o mundo mais difícil.
Sua carne é mais sensível e suculenta que qualquer outra. Todos querem atrocidá-la com gozo nobre, sincero, e horrível.
Eis o terror da existência: o medo da deterioração carinhosa. Do espinho da mais bela rosa, que secou. Do galho da cerejeira que lhe fura os pés. Sempre.
E de sempre ruir aos pedaços, ela cai. Só existe a pequena alma. O corpo...morreu vivo; e a bondade do céu permite que o sol mostre-se, seque-a e conserve-a. A conserve aos abustres. Apreciadores da carne seca e merecedores de sua matéria. E aos vermes que surgem no fim da apoteose, resta apenas o espasmo da presença.
Ela sabe que o topo belo antecede o caos e a desavença. Que o mundo não é honesto, E que seu corpo é frágil.
Pequena, morta, sentindo e apodrecida ela vê a ruína do amor em nome da benevolência e sente o sofrimento da felicidade por tanto pensar que ama.

Ela está asfixiada. De tanto ar.