sexta-feira, julho 27, 2007

Sujeito oculto


Desce do ônibus, sai da calçada, pisa no meio-fio. Apenas estava seguindo a rotina que tinha estabelecido. O esgoto era sua boca e a boca o esgoto; com toda aquela fumaça que não tinha explicação. Não era raiva nem frio, era algo oculto.

Atravessa a rua, sente a face gelada com o sopro dos carros que passam depressa naquele espaço estreito, onde não caberiam dois corpos. As mãos queimavam, os lábios humedeciam-se a todo instante.

Volta um pouco, entra no ônibus, desce o morro e se sente mais retrógrado do que em outrora. Porém é um regresso contínuo, que só um pode entender, mesmo desentendido pelos seus próprios princípios.

Chegou a plataforma de embarque, as quais não confia nenhum pouco, prefere ler os ônibus porquê é mais seguro. E insegurança não o falta, já que vivemos num mundo de incerteza.

Não pode falar com a própria boca, sempre precisa de um narrador.

Teve medo de ver o escuro, de ouvir os gatos e de ser o que era todos os dias. Parecia até que algo novo ia acontecer nesse dia.

Deitou-se na cama, olhou a hora no seus relógios desordenados para que possa acordar todos os dias. Fechou os olhos que estavam abertos a pouco e (re)adormeceu.

A luz estava acesa, o rádio ligado e, os incensos eram acesos na cozinha, já que não conhecia os palitos de fósforo naquela casa. A bolsa estava caída no chão e a sacolinha de papel esperava deitada e tranquila que o dia voltasse pra que ela se sentisse um pouco mais animada, mesmo não sentindo.

Tirou o tênis e conseguiu sentir aquele chão gelado como o corpo que acabara de ser despido da cintura pra cima; era como se uma pedra de gelo descesse até os pés. Tirou as meias e a sensibilidade se escondeu no mesmo instante em que saiu do tapete.


...


Então pensou que era hora de progredir e agora se encontra tecendo os fatos que viveu e que inventou. Impressiona-se às vezes por causa da sua falta de termos e de verbos. Não consegue acreditar que quem lê livros velhos não tenha um bom vocábulo. A vontade de buscar mais alguma coisa sumiu, o sujeito ocultou-se denovo e não sabe se ainda quer voltar.

quinta-feira, julho 26, 2007

A espera

A caixa sonora, o livro debruçado sobre a mesa, triste e sólido; o rádio com o volume reduzido, o chiado da música, os olhos fechados; tudo escuro.
Lembrava até um momento de vazio, de solidão. Um momento rude, gélido e desprevenido. Qualquer forma de dor poderia atingir o corpo, afinal de contas, só conseguia pensar em uma coisa: o depois.
Esperava que depois de nascer denovo, tudo fosse melhor, que as coisas crescessem mais rápido, que o mundo não girasse e que a luz não sumisse jamais. Que ficasse eternamente ali, aquecendo e iluminando.
Os ponteiros estavam criando uma nova melodia a cada instante, uma nova forma a cada passo, um novo desenho que tentava fazer. Só que sem sucesso. O desenho nunca acaba nos ponteiros.
O tempo que sempre trás consigo a angústia, trazia naquele momento a incerteza; incerteza de que os seus desejos eram exatos.
O corpo jogado nos panos esperava por um momento inerte que fosse eterno. Só não esperava morrer.

A noite veio e as vozes se calaram já que não podiam estar mais ali. Os olhos não queriam mais abrir e a sua voz estava sumindo. O sangue jorrava dentro de seu peito mas não sabia como dizer que era chegada a hora do último abraço. Não podia dizer.
Os dentes quebrados, a língua aprisionada pelos lábios que tanto falavam, não podia lamber o toque suave que o amor lhe proporcionava em alguns períodos.
A chuva de lágrimas que invadiam os olhos cessara e agora só o que restava a ele, era tentar abrí-los e amenizar a angústia de não ver mais o resto do mundo que acolhia com suspiros suaves todos aqueles que o habitam.

Depois da chuva, nada mais existia... Pra sempre.

terça-feira, julho 24, 2007

Contexto ambíguo

Um olhar tão penetrante, uma fonte momentânea de inspiração. Tuas ações inocentes desaceleram meu coração, quase me ensurdecem.


Teus alertas assustadores, tuas mãos tão grandes, tua face sempre tão molhada. Parece até que ainda não saístes da rua.


Teus ouvidos são tão aguçados que entendem meus pequenos balbucios e meus fracos ruídos.


Isso deve ser instinto, não sei...


Tão presa por outros, tão fraca, impossibilitada, vives à mercê das ofertas.


O carinho renasce todas as manhãs, mesmo que o Sol não venha.


A tua guarda não é mais que um grande favor, e a tua vida é que atribuo grande valor...


Sabe, perdi a folha onde te escrevi, guardei um pouco em mim e sei que o resto está em ti.

quinta-feira, julho 19, 2007

À pessoas que ainda não conheci

Ele podia sentir, mesmo que na distância, a evidência do amor mostrado por ela. Ela o sabia com os olhos e com os lábios. Ele a palpava na alma, usando a íris. Os braços e mãos não se entrelaçavam, porém os lábios, ah!, os lábios buscavam juntos palavras pra expressar tanto amor. Amor que não cabia dentro do ciúme. Amor que para as palavras parece suspeita.
Os dois corpos, ali, juntos, vestidos e presentes, não aparentavam uma necessidade única de se encontrar. Queriam calor, o calor do que os mantém vivos, o calor da alma, se é que ele existe.
A dança, os movimentos e os olhares os envolviam cada vez mais. O toque rápido e o beijo mostravam cada vez mais a busca de uma palavra--chave que libertasse o amor.
Mesmo não precisando, achavam. E era amor.

Espera por um final...

Estamos cansados de ódio. Estamos, estamos e estamos. Por isso estamos assim. Com raiva. Porque estamos. Estamos falando, estamos argumentando, pensando. Estamos. Por mais que estejamos dispostos, continuamos. Parados, pensando. Estou bem, logo não interessa mais ninguém. Não estamos revoltados. Estamos cansados. Estamos esperando, esperando e esperando por um ponto final. Um ponto final. Uma solução, uma saída. Qualquer coisa.
Estamos esperando o amor florescer denovo. A conversa desabrochar denovo. Sem medo. Oh, não! Estamos cansados, com sono pra abrir os olhos agora. Falamos de guerra e alguns fabricam armas. Falamos da vida e outros se entregam à morte. Estamos sentados, mas estamos correndo. Fugindo disso tudo. Acomodando? Resignando? Sonhando?
Estamos prestes a qualquer coisa, qualquer grito silencioso. Estamos boicotando, estamos em silêncio. Ninguém vê. Ninguém precisa saber que estamos estáticos, analisando, vendo e protestando. Estamos do lado.

Falamos, falamos e falamos.

terça-feira, julho 17, 2007

Retas

"A soma das grades, das portas, dos detalhes, das linhas, das aerodinâmicas, das ondas, das mãos, das almas, das ruas, dos tubos e dos esconderijos lá fora, robotizam-me.
Viver por...
Buscar por...
Comer por...
Sair por...
Somar por...

Não existe um sentido exato. Exatidão que me tira de mim. Que me joga longe,longe... Me perdi. Não quero me encontrar.
Estou ficando velho...Isso é grave. Minhas mãos não mais tão retas. Minhas costas tão mais curvas. Meus pequenos segredos são mais piadas na cota de risos gratuitos.
A vida... Por si só... Já basta...?"

Por pensamentos perdidos na tarde

É... Pode até ser que seja verdade, mas não. Eu não acredito, não.
Bem que eu te disse que essa tremedeira toda, essa vontade de gritar, essa nostalgia, isso tudo ia te fazer um bem... Que podia soar a amor. Mas não. Eu não acredito, não!
Às vezes parece que exclamar é estar furioso, trovejando palavras de exaltação ou até mesmo um balbucio choroso. Mas não. Eu acredito que exclamar seja suspirar devagar, respirar fundo, encher os pulmões e declarar guerra.
Perdes a tua rotina, encontro meu caminho. Essa é a verdade, mas não. Eu não acredito, não.
E também não acredito que possa ser real um desejo tão pequeno e vazio. Parece até que meus pés estão na corda-bamba... Estáticos, mas prontos para cair. Prontos para uma ascensão sem lógica.
Eu quero viver no fogo, nadar com os tubarões, jogar flores no vento,quebrar a linha de pano, fumar os ares e jorrar o sangue da liberdade.
Eu acredito... No quê? Em quê? Milagres?!

Ah, cavalo branco... Inspira risada e risos. Sátiras maravilhosas são feitas de nossas vidas e histórias e nem sabemos. Aos leigos, nada mais que um preconceito social baseado numa crença ou num livro.
Bem sabes que não...
Não o és.

segunda-feira, julho 16, 2007

Euforia estendida

Trancado dentro da intensidade daquele olhar e vislumbrado com o movimento das mãos colocadas com força para o alto, sinto que és aquilo que precisava ver para ter mais energia. As luzes te alteravam a cada segundo, a tua loucura me fazia mais feliz. O barulho, a violência, a cantoria, tudo exalava liberdade. A pura liberdade que existia. A mistura fina das ideologias mais variadas nos trouxe pra onde estamos. Num movimento inerte e puro, sem pretensão nenhuma de crescer fora. Só de existir.
É um amor mascarado que não se vê, não se toca, não se respira, não se muda nunca dos corações. Eu não sou Jesus nem qualquer outro tipo de revolucionário, mas estou pronto pra bagunçar a minha mente. Pra mudar o meu sistema, pra me embalar na tua manta e me deixar ser sem depender de mim pra ser por ti. Somos por nós, por todos, por uns e por outros.
Que tal amarmos sem medida? Que tal forjarmos um amor que não existe? Quem topa dar amor? Quem quer amar sem saber?
Eu amo todos vocês, eu preciso de todos vocês.. Minhas pernas tremem ao pensar nisso. Minha solidão me gratifica tanto porquê sei da vossa existência e posso contemplar as imagens de longe sem precisar tocar.
O som grave da companhia é forte, porém a gravidade da solidão é tão mais forte que enlouquece os maus e fortalece os bons.. Os ruins? São tão bons que estragam. Os bons? Só precisam piorar...

*I'm not Jesus - Apocalyptica feat. Corey Taylor*

sexta-feira, julho 13, 2007

Hora de trabalhar

Entra e olha pro lado, sente a solidão
Espanta os pássaros, destrói a beleza
Que um dia restou do seu coração.
Foi máquina direto ao muro,
Saudou um coração de plástico
Como se fosse puro.
Não precisa mais saber de mágica,
Não precisa mais saber da filha.
O alimento na marmita,
Arroz com feijão
Com gosto do cigarro
Da esposa Rita.
Se reúnem os amigos
Pra contar mentiras
E continuar a empreitada.
Sem o auxílio de um carro
Trabalha todos os dias com o mesmo alívio,
Cuspindo no mesmo lugar
O mesmo catarro...

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Me arrisco a indicar "O Rancho da Goiabada" de Elis Regina. Achei uma linda canção...

terça-feira, julho 10, 2007

Contudo, saio de mim e pouso ao lado. Ao lado do que mais me faz amar. Amor que me eleva ao nada.Eu só queria te contar que eu fui lá fora, e vi a vida arder sem explicação, sem razão. Meus pára-quedas me fazem cair a todo instante. Não tem explicação pra falar de amor a essas horas.
Enfim, estou em mim à toa. Eu te quero há um tempo. Eu te vejo presa, colada no teu próprio rosto, acuada por nada.

As flores que se cultivam no chão, não consentem com a solidão da manhã nem com o calor vespertino que é uma inspiração libertina dos nossos atos inconsequentes. Palavras difíceis, olhares escondidos, pessoas doentes. Sabes bem que eu não sei a explicação disso.

Aliás, se eu tivesse um mapa do meu nada que te levasse até a marca do tesouro, o que faria? Risos muito doces para uma alma como a tua.
O tesouro escondido és tu, tudo. Aquela criatura saiu a noite à procura para querer ser livre. Se prendeu, se esqueceu.

Será que ela evolui?

segunda-feira, julho 09, 2007

A caminhada até a plataforma de sempre hoje fora cansativa para ele. Sentou-se, olhou as placas de anúncios que sempre olham para ele na esperança por um consumidor a mais. Olhou as pessoas, olhou as roupas que as mistificam enquanto as revelam como personalidade. Ele trocava cada peça por um sentimento, cada gesto por uma característica. Recordava-se dos tempos em que não saía sozinho de casa. Quase chorava ao pensar na companhia que ele fazia a ele mesmo, na mesma espera.

Olhou mais perto de si e viu uma mulher. Aquelas que são elegantes até de manhã cedo, aquelas que guardam brilho e cor nas menores curvas. O seu cabelo ajeitado por trás das orelhas, longos e ondulados, o faziam viajar na criação de novos desenhos e novas texturas, as quais não podia tocar. Sua imensa vontade de tocar aqueles ombros e dizer que estava fazendo um lindo dia não podia se materializar. As pessoas costumam se assustar com algumas reações. Mas ele podia sentir as palavras de concordância saindo da boca. Arriscaria ou ficaria ali, ao lado, se penitenciando por não falar?

Não o disse e nem se arrependia por não ter dito. Era um covarde convicto. Sabia que falar e fazer era difícil, então pensava. Quase um filósofo prestes a alcançar sua máxima do pensamento, mas não chegava a nada. Pela manhã via, além de pessoas e máquinas, o lindo sol que esboçava linda luz por trás das nuvens que pareciam montanhas gigantes e a civilização abaixo, sempre tão pequenina e insignificante aos cuidados da luz. As manhãs cinzentas não arrebatavam-no à outra era.

As placas que ele via pela rua transformavam tudo em Eterno e tudo em realidade. Sempre saciando um desejo insaciável, esse desejo de eternizar, de sonhar. Essas placas mudam, voltam, mudam.Tudo pra eternizar uns momentos comprados, uns sonhos que virão realidade com a mão no bolso. Ele viu que não precisava sair de casa para ser eterno e feliz. Decidiu então, voltar ao primórdio da consciência ao modo de tentar ser gente. Fazia tudo muito devagar, mas não o queria assim. Sentia todos os dias o vento, mas não o via. E assim era com a determinação dele, sentia ela todos os dias, mas não a via.Não a via projetada em nenhum canto mas ela o motivava de alguma forma. O motivava a aprender por si só. A pernoitar no pensamento e na arte de ler, caminhar no nada e não dormir. Porque se dormisse, jamais iria acordar.

quinta-feira, julho 05, 2007

Criando desejos

Realiza-se lá no fundo hoje o que precisava e o que esperava. As formigas andando nos cabelos doces, com suas finas patas, mostram que existe um bom gosto. O cão lambe os sapatos, o tornozelo, as mãos, as patas, cheira as orelhas. O sol exerce seu papel de estrela guardiã, ao menos nos seu turno, vigiando constantemente quem ilumina. Aqueceu corpo e alma que envelhecem, descreveu traços sombrios nos quadrados pisados no chão. O portão de ferro não bate mais, está fechado. A portão de ferro não mexe mais, está descontrolado. A seta que acompanha o ritmo dos apertos que são uma manifestação expressiva, é uma fiel escudeira, que segue o caminho das letras, independentemente do que elas digam.
Foi o bem que se instaurou nos corpos deitados, com suas cabeças uma sobre a outra, acariciando e cheirando e sentindo, tudo ao mesmo tempo.
Criando, desejando e querendo. Querendo ver denovo um cometa logo pela manhã. Desejando mais um pouco de alma e virtude. Criando um sonho que pro agora é distante. Usava frases que não cabem em nenhum papel, só na cabeça. Dizia coisas que não ficavam na memória, só no papel e na tela. Fazia rascunhos com as lembranças que estão arquivadas em qualquer lugar por aí.
É fácil entender e não precisa nem se entregar, só ler.

quarta-feira, julho 04, 2007

Ele, tão poderoso Ele

Tão determinado pra não poder sair às ruas. É pouco infiel com a paixão de Cristo. Ele fala as chagas da alma como se fossem seus prazeres. Ele beija os estigmas com tanto amor que o sangue não tem gosto de sangue. É vinho. É néctar divino. Vem do filho amado, do redentor consagrado. O ateísmo dele não se faz ao Filho, só ao Pai. Ao pai que o nega palavras, quaisquer que sejam. Ele odeia casas cheias, não pisa nas cabeças e não olha para os lados. Só olha pra baixo. Ele às vezes não tem rosto.
A melodia que ele ouve, vem do vento. O reflexo no espelho configura outro ser. Não ele. Ele se entrega de braços abertos à solidão. Lê Alváres de Azevedo e Lord Byron com o objetivo de se tornar mais antropófago que antes. O difunto para ele não interessa, é carne morta. Os corpos que cultiva, são imagens do outro lado. A loucura do Pai em criar os filhos, foi longe demais. Ele não aguenta receber morte sem motivos.
A cota do espaço sagrado está escassa ultimamente. Os filhos não teram tanto dinheiro assim. O dízimo já não serve mais, segundo Ele. Precisamos de mais. Então que doem tudo.
Ele se alimenta de alma e de carne viva. Ele olha para os lados e ouve o som do escuro, o som do silêncio. Ele cria periodicamente enquanto mata com rapidez e pique. Ele cansa de ver a mesma coisa todo dia e viaja até onde conseguir. Ele explora, com medo, o que for possível. Ele se repete muito. Ele não se contradiz, imagina. Ele não sabe mais amar ninguém. Só o ego...
As conclusões Ele tirou antes de acontecer. Ele sabe tudo. Ele controla tudo. Ele pontilha tudo. Ele é nada pra uns. Ele é tudo pra alguns. Ele é importante, porém vago, pra milhões.
Os filhos... ah,os filhos! O que serão eles, se não filhos?
E o Filho, ressucitaria denovo pra salvar os filhos?

terça-feira, julho 03, 2007

Quero falar sobre as soluções. As soluções que talvez se encontram escondidas na memória, na memória de misérias. Na dor e no sofrimento de uma visão de pequenos corpos, com pequenos gritos, mostrando corações quebrados. Como é possível esperar o arrepio sem provocar a sensação, sem buscar a emoção?
Eu falo seu nome, por conforto, por espera de uma solução. Pela espera do fim de um coração eu estou esperando..
Os meus reflexos estão se multiplicando, e eu não me encontro mais.
Estou esperando uma nova solução para o fim de um coração.

segunda-feira, julho 02, 2007

O bar da libertinagem

Depois de ver o que havia dito e o que tinha pensado, foi parar na frente de um pequeno boteco, daqueles onde ficam os libertinos mais sujos e mais promíscuos. Andou, chegou perto do mais sujo, do menos puro, do impróprio. Impróprio para o momento, diga-se de passagem. Olhar para aqueles olhos que quando embriagados pareciam ver melhor e tocar nas mãos calejadas que agora pareciam estar mais suaves por causa do banho de álcool que levaram, a deixavam mais impressionada. Não sabia quem amava mais. Se a ela mesma ou tentava amá-lo sem medidas. As medidas que ela traçava não consentiam com as formas que ele esboçava.

Os dedos enlaçados, pareciam criar poucos traços abstratos que davam abertura para criação de novas figuras na paisagem cor-de-pele. Enquanto naquela sensação indiferente de sonho, ou de devaneio como os gênios costumam tratar, não sentiam sequer o ar. Ela sabia que ele estava tomado por um elemento mais forte que o álcool e mais corrosivo que o tabaco. Ela sabia que ele a amava.

Ele nem imaginava o que era amar. Era um rico inocente. Um libertino. Um pobre promíscuo que não pensava em mais nada a não ser sexo. As pernas já fortes pelas corridas e caminhadas, não o mostravam fortes. Mas ele queria boas pernas para atrair ela. E ela com certeza o queria assim.

Deram goles de alegria. Andaram nas ruas que não foram da amargura. Saíram do bar da libertinagem para que fossem para o quarto dos vagabundos. Lá absorveram corpo e alma. Entregaram-se ao nada. Morreram de tristeza. Não sabendo que era sempre amor.